Linha R$ 30 Bi: Governo Define Acesso ao Crédito Anti-Trump

Executivo federal estabelece contrapartidas para empresas prejudicadas por sobretaxa americana e batiza programa de “Brasil Soberano” em resposta às pressões externas

O governo federal desencadeou nesta quarta-feira (13) a artilharia pesada contra os efeitos devastadores do tarifaço de Trump, anunciando as condições definitivas para que as empresas brasileiras acessem a linha de crédito de R$ 30 bilhões criada para enfrentar a sobretaxa de 50% imposta pelos Estados Unidos.

A medida, que ganhou o nome pomposo de “Brasil Soberano”, chega numa tentativa desesperada de conter o sangramento econômico que atinge o setor exportador nacional desde o dia 6 de agosto, quando as tarifas entraram em vigor. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva transformou em contrapartida obrigatória a manutenção do número de empregos pelas empresas beneficiadas, numa clara sinalização de que o Planalto não tolerará demissões em massa financiadas com dinheiro público.

Pacote de Socorro com Múltiplas Frentes

As medidas anunciadas pelo ministro Fernando Haddad vão muito além do crédito subsidiado. A Receita Federal foi autorizada a fazer diferimento de cobrança de impostos para as empresas mais afetadas, repetindo a estratégia utilizada durante a pandemia da Covid-19. Simultaneamente, o governo prorrogou por um ano o prazo para que as empresas consigam exportar mercadorias beneficiadas pelo drawback, mecanismo que permite suspensão ou isenção de tributos na importação de insumos.

O programa Reintegra também foi turbinado, permitindo que exportadores recuperem até 6% dos impostos pagos ao longo da cadeia produtiva através de créditos tributários. Para as grandes e médias empresas, a alíquota sobe para 3,1%, enquanto micro e pequenas empresas passam a contar com até 6% de benefício. A medida terá impacto de R$ 5 bilhões até o fim de 2026, segundo cálculos oficiais.

Guerra Comercial e Diplomática

O tarifaço de Trump não surgiu no vazio político. A sobretaxa foi justificada pelo presidente americano como represália à suposta perseguição judicial sofrida por Jair Bolsonaro no Brasil. Auxiliares de Lula revelaram que Trump condiciona qualquer diálogo ao encerramento dos processos contra o ex-presidente, que é réu no Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe.

Sem margem para negociação diplomática, Lula intensificou a busca por mercados alternativos. Na última semana, o presidente brasileiro conversou por telefone com o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e com o líder chinês, Xi Jinping. A estratégia é clara: diversificar destinos para os produtos que perderam competitividade no mercado americano.

Tramitação no Congresso e Desafios Políticos

A Medida Provisória “Brasil Soberano” entra em vigor imediatamente após publicação no Diário Oficial da União, mas enfrentará o teste de fogo no Congresso Nacional. Os parlamentares terão até 120 dias para aprovar o texto, prazo que coincide com o auge das tensões entre Executivo e Legislativo. A aprovação não está garantida, principalmente considerando o clima de confronto que marca a relação entre os poderes.

Fernando Haddad, durante a apresentação das medidas, não escondeu o tom beligerante: “Vamos enfrentar, como já enfrentamos várias situações difíceis neste país. E vamos superar mais essa dificuldade que é imposta de fora para dentro, mas infelizmente com o apoio de alguns setores radicalizados da sociedade brasileira”. O ministro da Fazenda fez clara referência aos segmentos que apoiam Trump no Brasil.

Prioridades e Critérios de Acesso

O presidente Lula foi categórico ao definir as prioridades do programa: “A gente está pensando em ajudar as pequenas empresas, que exportam espinafre, frutas, mel e outras coisas. Empresas de máquinas. As grandes empresas têm mais poder de resistência”. O governo estabeleceu que o acesso às linhas de crédito priorizará empresas com maior dependência da receita proveniente das exportações para os Estados Unidos.

Pequenas e médias empresas poderão acessar fundos garantidores com a União depositando R$ 1,5 bilhão em recursos administrados pelo Banco do Brasil e BNDES. Essa quantia integra o montante total de R$ 30 bilhões do pacote. O critério técnico considera o grau de vulnerabilidade de cada setor, com foco especial nos produtos perecíveis que ficaram encalhados devido à sobretaxa.

Contexto e Informações Complementares

• Tarifaço de Trump: A sobretaxa de 50% entrou em vigor no dia 6 de agosto de 2025, afetando 35,9% das mercadorias brasileiras enviadas ao mercado norte-americano, o que representa 4% das exportações totais do Brasil
• Donald Trump: 47º presidente dos Estados Unidos, assumiu o cargo em janeiro de 2025 em seu segundo mandato, implementando políticas protecionistas contra diversos países
• Drawback: Regime especial de importação que permite suspensão ou isenção de tributos federais sobre insumos importados utilizados na fabricação de produtos destinados à exportação
• Programa Reintegra: Mecanismo que permite às empresas exportadoras recuperar parte dos tributos federais, estaduais e municipais pagos ao longo da cadeia produtiva através de créditos tributários
• Jair Bolsonaro: Ex-presidente do Brasil (2019-2022), atualmente réu no Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe de Estado, encontra-se inelegível até 2030
• Guerra Comercial: Política econômica baseada na imposição de tarifas e barreiras comerciais como instrumento de pressão diplomática e proteção de mercados domésticos
• Medida Provisória: Instrumento normativo com força de lei editado pelo Presidente da República em casos de relevância e urgência, que deve ser aprovado pelo Congresso Nacional em até 120 dias
• Crédito Extraordinário: Recursos orçamentários utilizados em situações de emergência, fora do limite de gastos do arcabouço fiscal, como foi usado para socorrer vítimas de enchentes no Rio Grande do Sul
• Fernando Haddad: Ministro da Fazenda do governo Lula desde 2023, responsável pela coordenação das políticas econômicas e fiscais do país
• Geraldo Alckmin: Vice-presidente da República e ministro da Indústria e Comércio, coordena o comitê criado para tentar negociar com o governo americano